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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Livro: Na Companhia da Cortesã



A história é narrada pelo anão Bucino Teodoldi, misto de criado, cafetão e sócio da cortesã Fiammetta Bianchinni. E também um tanto filósofo. Não vou dizer mais nada, o livro fala por si mesmo. 

Só um lembrete: o romance começa em 1527.

p. 94 – sobre a chegada em Veneza:

Um vento surge sob o sol e corta a superfície em ondas espasmódicas. Se eu fosse pescador e visse um homem andando na minha direção, sobre a água, certamente largaria a rede e iria com ele. Mesmo que a sua igreja tenha acabado vendendo perdões aos ricos e danando os pobres.

p. 230 – no Jardim de Ticiano:

Em dias como o de hoje, quando a água brilha e o ar está viscoso com o perfume de jasmim e flores de pessegueiro, quase achamos estar no Paraíso. Tão doce quanto a Arcádia. Não era essa a frase que a sua mãe usava quando ela era pequena, para descrever as fragrâncias do jardim de um homem rico? Não foram essas mesmas palavras que minha senhora usou para me induzir a ficar em Veneza naquele primeiro dia, quando o nosso futuro parecia tão negro quanto seu escalpo ferido? Ao pensar nisso, sou atingido com força pela recordação, como se somente agora, aqui nesse exato momento, depois de todo esse tempo, eu sentisse que realmente chegamos ao destino da nossa viagem. E, no interior do deslumbre do sentimento, há também uma sensação de terror – sim, terror – de que ascendendo tão alto, se houver uma queda, será maior também.

p. 231 – sobre a beleza:

Se eu vivesse de novo, já não sei se iria preferir a beleza à feiura. Há ansiedade demais na sua fragilidade.

p. 269 – sobre religião:

O que acontece sempre se deve ao Deus em que se acredita? Os espanhóis católicos amputam menos dedos de seus reféns romanos do que os hereges alemães? Os judeus e os turcos sofrem infernos diferentes por heresias diferentes? Ou as piores agonias são poupadas para os luteranos, que nasceram na fé verdadeira, e depois a distorceram, transformando-a em outra? Durante anos houve reformadores em Veneza dizendo abertamente que a nossa Igreja deve mudar. Que os nossos apetites estão se tornando decadência, que a salvação não pode ser posta à venda, e que, quando se trata dos portões do paraíso, a construção de edifícios luxuosos é menos importante do que a caridade com os menos afortunados. Diga isso aos clérigos importantes que entretínhamos em Roma. E o que acontece se, quando chegar ao tribunal do Paraíso, o Deus que encontrar lá discordar? Ah... alguns pensamentos ficam melhor sem serem manifestos.

p. 300 – sobre pessoas  (só um trecho):

Somos homens e mulheres trabalhadores, todos nós: apesar do fardo da nossa raça ou deformidades, descobrimos maneiras de estar no mundo, sem depender de ninguém, ganhando a própria vida com um certo orgulho.

p. 311 – em uma igreja na ilha de Murano:

Baixo os olhos e me pego olhando fixamente para o chão: um lago de triângulos de mosaicos de pedras e mármore, diamantes e quadrados construídos dentro de círculos, que se deslocam para fora e fluem um para o outro, como as pequenas ilhas de Veneza, formando um todo. Olhando por mais tempo, localizamos imagens isoladas: a forma de um pavão com sua plumagem aberta e, perto, parece haver plantas ou outras aves. Quantos pedaços foram necessários para fazer um piso deste tipo? Quantas pessoas morrem por ano? Como seria, se fosse um mosaico de almas: um milhão de seres atravessando as chamas para fazer a matéria derreter, da mesma maneira que a fornalha transforma pedras em líquido e, se os ingredientes estiverem certos, purifica-os, tornando-os limpos e límpidos? O Paraíso é isso? Um processo de alquimia espiritual em que o corpo perde seu peso terreno e é transformado na matéria perfeita da alma?
*******

Criei um terceiro blog: única e exclusivamente para abrigar os meus favoritos, que são os blogs que eu sigo. Só assim para evitar a ameaça de um novo bug (como aquele que tirou vários blogs do ar) e me ajudar a colocar em dia as visitas. 

4 comentários:

  1. e o outro blog a gente nao pode ver? acho legal essa ideia de colocar os favoritos separados mas acho tambem meio chato nao ve-los, pois é uma forma da gente conhecer outros blogs.

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  2. Oi Patty, que lindos os trechos! Gostei especialmente desse sobre ser humano, pois é uma verdade simples dita de maneira direta e bela. Fiquei com vontade de ler esse, vou procurar! Ah! Terminei de ler a preceptora, vou ver se te mando ainda essa semana! Um abraço!

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  3. Muito bom os trechos. Também tenho um 3° blog para colocar alguns favoritos, não coloquei tudo no pitadas, pois fiquei com medo de ficar muito pesado.
    Bjos, Lú.

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  4. não conhecia esse livro, adorei os trechos q vc escolheu.

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